No dia 21 de abril de todo ano é comemorado feriado nacional, Dia de Tiradentes. Mas afinal, quem foi Tiradentes e qual seu papel para a história do Brasil?
Contexto histórico
Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, nasceu em 1746, em Santa Rita do Rio Abaixo, atual município de Ritápolis. Ele perdeu os pais ainda criança, e ficou responsável sob a guarda de seu tio, que na época, era dentista. Diferente de hoje, no século XVIII, não existia faculdade no Brasil. A título de curiosidade, a primeira faculdade só surgiu quando a família real chegou ao Brasil, em 1808, que foi a Faculdade de Medicina da Bahia, que pertence à UFBA, atualmente.
Voltando ao contexto, Joaquim aprendeu tal profissão com tio, o que lhe rendeu o celebre apelido de Tiradentes. Além disso, Tiradentes possuiu ao longo de sua vida várias outras profissões, como: tropeiro, minerador, comerciante, militar e ativista político. Apesar de não ter tido um estudo regular, ele era oriundo de uma família com boas condições, pois possuíam uma fazenda com atividade mineradora e uma quantidade de escravos considerável. Mesmo diante disso, após a morte dos pais, a fazenda acabou sendo desfeita por dívidas, e Joaquim seguiu sua vida.
Com os conhecimentos que adquirira no trabalho de mineração em sua fazenda, tornou-se técnico em reconhecimento de terrenos e na exploração dos seus recursos. Começou a trabalhar para o governo no reconhecimento e levantamento do sertão sudestino. Em 1780, alistou-se na tropa da Capitania de Minas Gerais; em 1781 foi nomeado comandante do destacamento dos Dragões na patrulha do "Caminho Novo", estrada que servia como rota de escoamento da produção mineradora da capitania mineira ao porto Rio de Janeiro na Serra da Mantiqueira.
Foi a partir desse período que Tiradentes começou a se aproximar de grupos que criticavam o domínio português sobre as capitanias por onde circulava. Insatisfeito por não conseguir promoção na carreira militar, tendo alcançado apenas o posto de alferes, patente inicial do oficialato à época, e por ter perdido a função de marechal da patrulha do Caminho Novo, pediu licença da cavalaria em 1787.
Após a licença da cavalaria, Tiradentes morou por volta de um ano na cidade carioca, período em que idealizou projetos de vulto, como a canalização dos rios Andaraí e Maracanã para a melhoria do abastecimento de água no Rio de Janeiro; porém, não obteve aprovação para a execução das obras. Esse desprezo fez com que aumentasse sua indignação perante o domínio português. De volta às Minas Gerais, começou a pregar em Vila Rica (atual Ouro Preto) e arredores, a favor da independência daquela capitania. Fez parte de um movimento aliado a integrantes do clero e da elite mineira, como Cláudio Manuel da Costa, antigo secretário de governo, Tomás Antônio Gonzaga, ex-ouvidor da comarca, e Inácio José de Alvarenga Peixoto, minerador e grande proprietário de terras na Comarca do Rio das Mortes. O movimento ganhou reforço ideológico com a independência das colônias estadunidenses e a formação dos Estados Unidos. Ressalta-se que, à época, oito de cada dez alunos brasileiros em Coimbra eram oriundos das Minas Gerais, o que permitiu à elite regional acesso aos ideais liberais que circulavam na Europa.
A Inconfidência Mineira
Desde a primeira metade do século XVIII ocorreram na capitania de Minas Gerais sucessivos motins. As razões para tais ocorrências variavam em torno de questões como tributação, abastecimento de alimentos e ações das autoridades, com destaque para a Guerra dos Emboabas e a Revolta de Filipe dos Santos. Enquanto alguns levantes buscavam apenas a restauração de um equilíbrio de poder, outros afrontaram a imposição da soberania régia. Foi o caso da sedição do sertão do rio São Francisco, ocorrida em 1736 e que se voltou contra as autoridades reais e a capitação — cobrança dos quintos reais (1/5 ou 20%) realizada com base no número de escravos.
Durante a Era do Ouro no Brasil, não podemos deixar de citar Vila Rica, atual Ouro Preto. A vila cresceu enormemente e, em 1723, já havia se tornado a capital das Minas Gerais. Por volta da metade do século XVIII, haveria de se transformar na maior cidade brasileira e o principal centro econômico da América portuguesa. Os homens mais ricos da colônia fariam da cidade o local de suas residências, bem como os mais destacados intelectuais. Existiam muitas construções de dois andares, as ruas centrais eram pavimentadas com pedras, ao contrário da maior parte das cidades do Brasil, e as igrejas apresentavam altares revestidos com ouro. Em 1786 apenas vinte e sete estudantes brasileiros estudavam na Universidade de Coimbra, sendo doze deles oriundos da capitania das Minas.
Os impostos e o controle português
Com a grande repercussão do ouro mineiro, o governo português começou a tomar providências que não agradou em nada os mineradores e aqueles que buscavam no ouro uma melhora de vida. Primeiramente, o governo instituiu a cobrança do quinto. Este tipo de imposto era válido sobre o ouro encontrado na região, que deveria ser encaminhado à Casa de Fundição, ser descontado por uma autoridade real e o restante, transformado numa barra de ouro com o selo real. Ainda, a circulação desse ouro só poderia acontecer em terra de domínio português, fora disso, era proibido.
Além disso, o fato de ter que fundir o ouro em pó e transformá-lo em barra desagradou a população, pois nem todos tinham ouro suficiente para ser transformados em barras, como os mais pobres, que nunca juntavam o suficiente e, por isso, continuaram vivendo como se a lei não fosse com eles. Além do mais, tal proibição acabou gerando problemas sérios no comércio, uma vez que o ouro em pó constituía-se na principal moeda de troca da época, pois era fácil pesar e fragmentar. Quem fosse apanhado com isso e não estivesse se dirigindo para as Casas de Fundição seria tratado como contrabandista, teria seus bens confiscados e poderia, até mesmo, ser deportado para a África.
Durante essa época, o rei de Portugal, D. João V, passou a achar que seus leais súditos estavam sonegando os impostos e lesando a Real Fazenda. Não importava quanto ouro arrecadassem. Para a corte portuguesa, as minas eram infinitas e, se não se alcançava a quantia desejada, era porque os mineradores empalmavam a parte que cabia ao rei por direito.
Então, a Coroa decidiu acabar com as Casas de Fundição, substituindo-as por um novo sistema de arrecadação: a Capitação, no qual os impostos eram "pagos por cabeça". O plano foi colocado em prática após o novo governador, tomar posse a 1º de setembro de 1732. Estipulou-se que o valor pago seria da ordem de 17 gramas de ouro por escravo a cada seis meses. Porém, anos depois, insatisfeita com a arrecadação, a Coroa Portuguesa reestabelece a cobrança do quinto, ordenando o funcionamento novamente das Casas de Fundição.
Entretanto, o governo português não imaginava que o auge do ouro estaria em declínio. Para a corte portuguesa e o Governador da Capitania de Minas Gerais, o ouro mineiro era infinito e que a cobrança dos impostos deveria ser efetuada a qualquer custo. Por isso, implementaram uma cota mínima a ser paga por ano: cem arrobas de ouro. Caso este valor não fosse atingido, a Coroa lançava a derrama, uma contribuição coletiva, rateada entre todos os moradores da capitania, mineradores ou não, para cobrir os prejuízos do rei. Entretanto, a cobrança de tal medida teria sido cobrado apenas uma vez, e após o declínio do ouro, o governo local foi 'empurrando com a barriga', ameaçando a cobrança da população.
Os revoltados
Os acontecimentos da época incomodou principalmente a classe mais abastada de Minas Gerais (proprietários rurais, comerciantes, intelectuais, clérigos e militares), que, descontentes, começaram a se reunir para conspirar. A conjuração pretendia eliminar a dominação portuguesa de Minas Gerais, estabelecendo um país independente. Não havia a intenção de libertar toda a colônia brasileira, pois naquele momento uma identidade nacional ainda não havia se formado. A forma de governo escolhida foi o estabelecimento de uma República, inspirados pelas ideias iluministas da França e da Independência dos Estados Unidos da América (1776). Ressalve-se que não havia uma intenção clara de libertar os escravos, já que muitos dos participantes do movimento eram detentores dessa mão de obra.
As reuniões aconteciam em casa de Cláudio Manuel da Costa e de Tomás Antônio Gonzaga, onde se discutiram os planos e as leis para a nova ordem, tendo sido desenhada a bandeira da nova República, — uma bandeira branca com um triângulo e a expressão latina "Libertas Quæ Sera Tamen". Inclusive, essa é hoje a bandeira do Estado de Minas Gerais.
Traição, prisão e sentença
O movimento foi traído por Joaquim Silvério dos Reis, que fez a denúncia para obter perdão de suas dívidas com a Coroa. Os réus foram acusados do crime de "lesa-majestade" como previsto pelas Ordenações Filipinas, Livro V, título 6, materializado em "inconfidência" (falta de fidelidade ao rei):
"Lesa-majestade quer dizer traição cometida contra a pessoa do Rei, ou seu Real Estado, que é tão grave e abominável crime, e que os antigos Sabedores tanto estranharam, que o comparavam à lepra; porque assim como esta enfermidade enche todo o corpo, sem nunca mais se poder curar, e empece ainda aos descendentes de quem a tem, e aos que ele conversam, pelo que é apartado da comunicação da gente: assim o erro de traição condena o que a comete, e empece e infama os que de sua linha descendem, posto que não tenham culpa."
Os líderes do movimento foram detidos e enviados para o Rio de Janeiro. Ainda em Vila Rica, Cláudio Manuel da Costa morreu na prisão na Casa dos Contos, onde estava preso assim como outros conspiradores com altos títulos sociais, e onde se acredita que tenha sido assassinado, suspeitando-se, em nossos dias, que a mando do próprio Governador. Durante o inquérito judicial, todos negaram a sua participação no movimento, menos o alferes Joaquim José da Silva Xavier, que assumiu a responsabilidade de chefia do movimento.
Em 18 de abril de 1792 foi lida a sentença no Rio de Janeiro. Doze dos inconfidentes foram condenados à morte. Mas, em audiência no dia seguinte, foi lido decreto de Maria I de Portugal pelo qual todos, à exceção de Tiradentes, tiveram a pena comutada. Os degredados civis e militares foram remetidos para as colônias portuguesas na África, e os religiosos recolhidos a conventos em Portugal.
Execução de Tiradentes
Tiradentes foi morto por enforcamento, sendo a sentença executada publicamente em 21 de abril de 1792, no Campo da Lampadosa, no Rio de Janeiro. Após a execução, o corpo foi levado em uma carreta do Exército para a Casa do Trem (hoje parte do Museu Histórico Nacional), onde foi esquartejado. O tronco do corpo foi entregue à Santa Casa da Misericórdia, sendo enterrado como indigente. A cabeça e os quatro pedaços do corpo foram salgados, para não apodrecerem rapidamente, acondicionados em sacos de couro e enviados para Minas Gerais, sendo pregados em pontos do Caminho Novo, onde Tiradentes pregou suas ideias revolucionárias. A cabeça foi exposta em Vila Rica, no alto de um poste de frente à sede do governo (atual Museu de Ciência e Técnica da Escola de Minas da UFOP).
O castigo era exemplar, a fim de dissuadir qualquer outra tentativa de questionamento do poder da metrópole. Dias depois de exposta, a cabeça de Tiradentes foi roubada do local - possivelmente por um idealista da revolta -, e nunca mais foi vista ou teve notícias.
Legado e herói nacional
Os positivistas que ajudaram a fundar a República no Brasil, buscaram firmar Tiradentes como uma figura republicana no país, mitificando sua biografia. Aquela caricatura nacional que conhecemos de Tiradentes foi criada baseada num caráter messiânico, como Jesus Cristo. Com barba, camisolão, cabelos longos e crucificado diante o público, a imagem construída pelo governo recém criado, acabou ganhando notoriedade e tornou-se a caricatura do inconfidente.
Como Tiradentes era militar, não poderia ter barba, talvez, no máximo, um bigode. Mesmo quando estava presa, era proibido que o detento tivesse muita barba ou cabelos longos, com o intuito de prevenir a proliferação de pulgas dentro das celas. Segundo o jornalista Pedro Doria, relatos da época declaravam que Tiradentes era "um homem alto, grisalho, a barba benfeita, bigodes bem-aparado", e o barbudo semelhante a Cristo só surgiu no século XX.
Durante anos o legado de Tiradentes foi questionado. Por uns aclamado, já por outros, somente um mero participante na história do Brasil. A comemoração do Dia de Tiradentes já fora suspensa em alguns momentos, virando feriado nacional somente em 1965, pelo presidente Castelo Branco.
Lugares para ir em Ouro Preto e conhecer a história de Tiradentes
Praça Tiradentes
Localizada no Centro Histórico de Ouro Preto, a Praça Tiradentes é o local onde a cabeça de Tiradentes foi exposta para o público. No local da exposição, existe uma estátua de Tiradentes sobre uma enorme estrutura, voltada de frente para o Museu da Inconfidência.
Museu da Inconfidência
O local é conhecido por ser a antiga cadeia da cidade. Tiradentes ficou preso lá por um tempo. Hoje, é o museu mais importante de Ouro Preto e um dos de Minas Gerais, com um rico acerco de peças do século XVII em diante. Lá também estão as peças de madeira usadas na forca de Tiradentes, como também, objetos pessoas do alferes. Além de existir uma espécie de memorial para os participantes da Inconfidência.
Casa dos Contos
O imóvel foi utilizada para prender alguns inconfidentes e serviu como Casa de Fundição. O poeta Claudio Manuel da Costa se enforcou em sua cela debaixo da escadaria durante seu aprisionamento na Casa dos Contos, em julho de 1789. Na Casa dos Contos também é possível encontrar muito sobre a história do ciclo do ouro em Ouro Preto, como barras cunhadas na época, e uma senzala no subsolo.
Fonte: Wikipédia
Fotos: Commons Wiki/Arquivo Nacional/Acervo pessoal
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